O cinema revela por meio da cenografia uma vasta composição de cidades, tornando-se um meio interessante para discutir as suas transformações. Essa arte permite que diretores explorem ao máximo seus universos imaginativos, através de cenários montados, efeitos visuais e especiais e toda a composição da imagem.
Em muitos filmes, diretores apresentam cidades futuristas, vivenciadas pelos personagens do enredo, que, por muitas vezes, se apresentam inteiramente novas aos nossos olhos. É através da busca do espectador de compreender e apropriar-se desses espaços cenográficos que a cidade se revela no cinema. Para alguns alguns estudiosos, o cinema é, em primeiro lugar, formado por uma convicção utopista. Ainda que se entenda utopia como uma sociedade perfeita ou idealizada, seu sentido etimológico formado por ou e topos, significa um não lugar, ou lugar nenhum (ou: não e topos: lugar), sendo utopia uma prática de criar um novo lugar, sejam essas concepções desenhadas, projetadas ou filmadas.
Dessa forma, a convicção utopista do cinema abrange lugares que entendemos como utópicos, que se caracterizam como uma sociedade em perfeito estado, e lugares distópicos, caracterizados por desordem, governos totalitários, escassez de recursos naturais e circunstâncias de vida intoleráveis. Situações que refletem diretamente nas moradias, nos espaços coletivos, nas atividades culturais, mercantis ou industriais: a cidade.
Quando refletimos sobre o futuro, a tecnologia é sempre um ponto em questão. Nas obras cinematográficas futuristas, os avanços tecnológicos podem indicar vantagens e contribuições para melhorias sociais e econômicas, como também a decadência desses fatores. Jogador Nº1, dirigido pelo Spielberg revela uma cidade de 2044 em completa desordem econômica e social.
Em oposição à visão sombria do futuro, o diretor Brad Bird aposta em Tomorrowland – Um lugar onde nada é impossível (2015) numa posteridade onde tudo pode dar certo. Elysium (2013) consegue expor essas duas realidades de forma bastante precisa, mostrando um contraste entre dois mundos.
O filme apresenta a Los Angeles de 2154 superpopulosa, desordenada e pós-apocalíptica patrulhada por policiais-robôs violentos. Vive-se uma pobreza generalizada causada pela degradação ambiental. Em meio a todo esse caos, uma pequena parte privilegiada da população, vive em Elysium, uma gigantesca estação espacial que forma um habitat artificial, onde vemos um espaço agradável, livre da fome, de violência, de ruínas e de tudo que assola o cenário da terra.
A necessidade de pensar a forma que as cidades poderiam tomar num futuro em seus âmbitos sociais e concretos através do cinema não é uma iniciativa nova. Na década de 20, onde a cidade utópica no cinema ergue-se com mais força ainda no expressionismo alemão, Fritz Lang dirigiu Metrópolis (1927), que ficou conhecido por exibir uma das cidades mais relevantes e simbólicas do cinema. O filme nos apresenta uma megalópole de pontes longas, arranha-céus, aviões circundando edifícios, carros e máquinas. Nesse filme podemos perceber de forma clara como a cidade recebe um novo destaque se revelando como componente mais importante da composição, pois são as imagens da cidade que mais se acentuam. Um dos pontos chaves do filme trata da questão social, uma cidade repartida em duas metades: na superfície, a classe privilegiada vive a cidade e aproveita o bem-estar à luz do sol (pensadores), enquanto abaixo dessa superfície empregados trabalham para dar funcionalidade à cidade que vive à luz do dia (trabalhadores).
Então, assim como arquitetos sugerem projetos com seus croquis, diretores de cinema sugerem mundos futuros habitados. Por meio dessa possibilidade e liberdade oferecida pelo cinema, essa arte é capaz de abrir nossos olhos para aquilo que não enxergamos no cotidiano urbano. Cineastas observam, estudam e imaginam o urbano, no que ele pode se transformar – em suas próprias visões, é claro – e quais as consequências disso no viver urbano através de suas narrativas. Por meio disso o cinema torna o invisível, visível. “Podemos considerar que o cinema é visionário. Ele anuncia novos mundos que são novos modos de ver, sentir e compreender a realidade” – G. D. Jorge